Estamos vivendo o início da era das “postagens zero”?

Postagens zero

Durante anos, a lógica das redes sociais parecia simples: quanto mais postagens, mais conexões. Mas, segundo o escritor e jornalista Kyle Chayka, esse ciclo está perto do fim. Em entrevista à BBC, ele descreve uma mudança silenciosa, porém significativa: estamos postando cada vez menos e repensando se faz sentido continuar compartilhando nossas vidas em público, em um fenômeno que ele chama de “postagens zero“.

Esse movimento sinaliza uma possível transição para um novo paradigma digital. Nele, a vida nas redes deixa de ser exibida em praça pública e passa a se desenvolver em espaços mais íntimos, privados e silenciosos, como grupos de WhatsApp, mensagens diretas e plataformas efêmeras.

Dados recentes mostram que cerca de um terço dos usuários de redes sociais postam menos do que há um ano. A queda é especialmente visível entre a geração Z. Isso porque, no lugar das fotos de amigos e relatos de vida cotidiana, os feeds são ocupados por anúncios, influenciadores e vídeos gerados por algoritmos. O conteúdo pessoal virou exceção.

Para Chayka, as redes sociais passaram a funcionar como vitrines de consumo aspiracional, muito mais parecidas com uma vitrine de shopping do que com uma reunião entre amigos. “Se as plataformas estão perdendo o foco na vida normal das pessoas, as redes sociais se tornam como a televisão”, afirma.

Durante a última década, o contrato social implícito era algo como: compartilhe momentos da sua vida e, em troca, receba atenção, engajamento e pertencimento. Só que essa troca já não parece vantajosa. O conteúdo pessoal é cada vez mais engolido pelos algoritmos, os riscos de exposição pública são altos, e a recompensa vem diminuindo.

“Por que postar sua selfie ou seu café da manhã se ninguém presta atenção, se você não atinge seus amigos e concorre com todo esse lixo remoto e abstraído?”, questiona Chayka. Para ele, a lógica das redes sempre teve algo de artificial e estamos, enfim, acordando para isso.

Essa transformação não significa o fim da vida digital, mas uma reorganização de seus espaços. A interação continua intensa, mas migra para os bastidores. Grupos de conversa, mensagens diretas e plataformas mais fechadas tomam o lugar das timelines públicas.

Para Chayka, portanto, o futuro das redes pode se parecer cada vez mais com a televisão: um fluxo ininterrupto de conteúdo passivo, produzido por empresas ou por inteligência artificial. Já as conversas sociais tendem a se concentrar em ambientes fechados ou até mesmo na vida real, em um possível retorno ao offline.

O fenômeno das postagens zero, apesar de sutil, pode representar um passo importante rumo ao uso mais consciente da tecnologia. Em vez de nos sentirmos obrigados a produzir conteúdo o tempo todo, poderemos escolher quando, como e com quem compartilhar. E talvez, no fim das contas, isso nos conecte de maneira mais genuína.

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